segunda-feira, 25 de março de 2013


As coisas da carne


A carne tem muitas saídas. Aprendemos que é hostil a Deus e não pode Lhe agradar de nenhum modo. Entretanto, nem o crente nem o pecador podem avaliar genuinamente a absoluta inutilidade, perversidade e contaminação da carne da maneira que o vê Deus, se não o mostra o Espírito Santo. Só quando Deus, por seu Espírito, revela ao homem a verdadeira condição da carne tal como Deus a vê, pode o homem enfrentar-se com sua carne.
As manifestações da carne são bem conhecidas. Se um homem for rigoroso consigo mesmo e se negar a seguir, como costumava, «os desejos do corpo e da mente» (Ef. 2:3), se dará conta com facilidade de quão sujas são estas manifestações. A carta do Paulo aos Gálatas dá uma lista destes pecados da carne para que ninguém se possa confundir:

«Ora, as obras da carne são manifestas, as quais são: a prostituição, a impureza, a lascívia, a idolatria, a feitiçaria, as inimizades, as contendas, os ciúmes, as iras, as facções, as dissensões, os partidos (literalmente, "seitas"), as invejas, as bebedices, as orgias, e coisas semelhantes a estas, contra as quais vos previno, como já antes vos preveni, que os que tais coisas praticam não herdarão o reino de Deus.» (5:19-21).
Podemos dividir estas obras da carne em cinco grupos:
1) pecados que mancham o corpo, tais como a imoralidade, a impureza, a libertinagem;
2) comunicações sobrenaturais pecaminosas com as forças satânicas, tais como a idolatria, a bruxaria;
3) temperamento pecaminoso e suas peculiaridades, tais como inimizade, lutas, ciúmes, ira;
4) seitas e bandos religiosos, tais como o egoísmo, as dissensões, o espírito partidarista, a inveja;  e
5) lascívia, tais como a embriaguez e as orgias. Cada uma destas é facilmente observável. Os que as fazem são da carne.
Nestes cinco grupos distinguimos alguns pecados que são menos pecaminosos e outros que sujam mais, mas apesar de que possamos considerá-los mais repugnantes ou mais refinados, Deus revela que todos têm a mesma procedência: a carne. Aqueles que cometem com freqüência os pecados mais degradantes sabem que são da carne; entretanto, como é difícil para os que triunfam sobre estes pecados relativamente mais degradantes, reconhecer que são carnais!
O primeiro passo na obra do Espírito Santo é nos convencer e nos declarar culpados de nossos pecados. Assim como sem a iluminação do Espírito Santo um pecador nunca verá a maldade de seu pecado e não fugirá da ira futura para a obediência de Cristo, também um crente precisa ver seu pecado pela segunda vez. Um cristão deveria reprovar a si mesmo pelo seu pecado. Como poderá ser espiritual se não se der conta de toda a perversa e desprezível que é sua carne e não se detesta a si mesmo? Oh, seja como for que pequemos, continuamos pertencendo à carne! Agora é o momento de nos prostrar humildemente diante de Deus, dispostos a que o Espírito Santo nos convença de novo de nossos pecados.





O espírito, a alma e o corpo depois da queda

Adão vivia pelo fôlego de vida que se fez espírito nele. Por meio do espírito, recebia Deus, conhecia a voz de Deus e tinha comunhão íntima com Deus. Era profundamente consciente de Deus. Mas, depois da queda, seu espírito morreu.
O que é realmente a morte? Segundo a definição científica, a morte é «o afastamento da comunicação com o meio ambiente». A morte do espírito é o afastamento de sua comunicação com Deus.
A morte do corpo é a interrupção da comunicação entre o espírito e o corpo. Assim, quando dizemos que o espírito está morto, não implica que já não haja espírito. Só queremos dizer que o espírito perdeu sua sensibilidade para Deus e por isso está morto para Ele. A situação exata é que o espírito está incapacitado, é incapaz de ter comunhão íntima com Deus.
O pecado destruiu o profundo conhecimento intuitivo que o espírito tinha de Deus e tem feito o homem espiritualmente morto. Pode ser religioso, moral, erudito, capaz, forte e sábio, mas está morto para Deus. Inclusive pode falar de Deus, raciocinar a respeito de Deus e pregar sobre Deus, mas continua estando morto para Ele. O homem não pode ouvir ou perceber a voz do Espírito de Deus. Em conseqüência, Deus, no Novo Testamento, chama freqüentemente mortos aos que estão vivos na carne.
A morte que começou no espírito de nosso antepassado se estendeu gradualmente até alcançar seu corpo.  Seu corpo, que poderia ter sido transformado e glorificado, em vez disso voltou para o pó. Como seu homem interior tinha caído no caos, seu homem exterior devia morrer e ser destruído.
 O escritor de Hebreus afirma em 4:12 que a Palavra de Deus transpassará e separará a alma e o espírito. A separação é necessária porque o espírito e a alma se tornaram um. Enquanto estão intimamente unidos, submergem o homem em um mundo físico. Tudo se faz seguindo os ditados do intelecto ou do sentimento. O espírito perdeu seu poder e sua sensibilidade, como se estivesse totalmente adormecido. O instinto que ainda tenha para conhecer e servir a Deus está completamente paralisado. Permanece em coma, como se não existisse. É a isto que se refere Judas 19 quando diz «natural, sem espírito» (literal).* Claro está que isto não significa que o espírito humano deixe de existir, porque Números 16:22 afirma claramente que Deus é «o Deus dos espíritos de toda carne». Todo ser humano continua possuindo um espírito, embora esteja obscurecido pelo pecado e impotente para ter comunhão com Deus.
Embora este espírito esteja morto para Deus, pode permanecer tão ativo como a mente ou o corpo. Deus o considera morto, mas ainda é muito ativo em outros aspectos. Em algumas ocasiões, o espírito de um homem caído pode inclusive ser mais forte que sua alma ou seu corpo, e pode conseguir o domínio sobre todo o ser. Estas pessoas são «espirituais», da mesma maneira que a maioria das pessoas são anímicas ou físicas em sua major parte porque seus espíritos são maiores que os das outras pessoas. Estes são as bruxas e os feiticeiros. É certo que mantêm contato com o mundo espiritual, mas o fazem por meio de espíritos diabólicos, não pelo Espírito Santo. Deste modo, o espírito do homem caído se alia com Satanás e seus espíritos diabólicos. Está morto para Deus, mas certamente muito vivo para Satanás e segue aos espíritos diabólicos que trabalham nele.
Ao ceder às exigências de suas paixões e desejos carnais, a alma se converteu em escrava do corpo, de maneira que o Espírito Santo não tem oportunidades para lutar com o objetivo de recuperá-la para Deus. Por isso a Bíblia afirma: «O meu Espírito não permanecerá para sempre no homem, porquanto ele é carne» (Gn. 6:3). A Bíblia diz da carne que é a combinação da alma não regenerada e da vida física, embora a maioria das vezes assinale o pecado que está na carne. Uma vez que o homem está sob o domínio da carne, não tem nenhuma possibilidade de libertar-se. A alma substituiu à autoridade do espírito. Tudo se faz independentemente e segundo os ditados de sua mente. Inclusive em assuntos religiosos, na mais apaixonada busca de Deus, tudo se leva a cabo com a força e a vontade da alma do homem, carente da revelação do Espírito Santo. 
A alma não é simplesmente independente do espírito, mas, além disso, está sob o controle do corpo. Lhe pede que obedeça, que execute e que satisfaça os desejos carnais, as paixões e as demandas do corpo. Assim, todo filho de Adão não só está morto em seu espírito, mas sim também é «da terra, um homem do pó» (1 Co. 15:47).
 Os homens caídos estão sob o domínio total da carne, atuando em resposta aos desejos de sua vida anímica e de suas paixões físicas. São incapazes de ter comunhão íntima com Deus. Às vezes desenvolvem seu intelecto, em outras ocasiões sua paixão, mas o mais freqüente é que desenvolvam tanto seu intelecto como sua paixão. Sem empecilhos, a carne controla firmemente o homem todo.
1 Coríntios 2:14 fala destas pessoas não regeneradas da seguinte maneira: «O homem natural (anímico) não recebe os dons espirituais de Deus porque para ele são loucura, e não pode compreendê-los porque se discernem espiritualmente.» Estes homens se encontram sob o controle de suas almas e com seus espíritos reprimidos contrastam totalmente com as pessoas espirituais. Podem ser portentosamente inteligentes, capazes de apresentar idéias e teorias com autoridade, mas não admitem as coisas do Espírito de Deus. Não estão capacitados para receber a revelação do Espírito Santo. Esta revelação é absolutamente diferente das idéias humanas. Os homens podem pensar que o intelecto e o raciocínio humanos são todo-poderosos, que o cérebro pode compreender todas as verdades do mundo, mas o veredicto da Palavra de Deus é: «vaidade de vaidades».
Quão certo é que, sem a direção do Espírito Santo, o intelecto não somente é pouco confiável, mas  também é extremamente perigoso, porque freqüentemente confunde o bom e o mau. Um ligeiro descuido pode provocar, não simplesmente uma perda temporária, mas inclusive um dano eterno. A mente obscurecida do homem freqüentemente o leva à morte eterna. Se as almas não regeneradas pudessem ver isso, que bom seria!
No entanto o homem carnal pode controlar outra coisa além da alma: também pode estar sob a direção do corpo, porque a alma e o corpo estão fortemente entrelaçados. Como o corpo do pecado abunda em desejos e paixões, o homem pode cometer os pecados mais espantosos. O corpo vem  do pó e por isso sua tendência natural é para a terra. A introdução do veneno da serpente no corpo do homem converte todos seus desejos legítimos em desejos carnais. Uma vez que a alma cedeu diante do corpo, ao desobedecer a Deus, encontra-se obrigada a ceder sempre. Os baixos desejos do corpo podem desse modo expressar-se através da alma. O poder do corpo se torna tão entristecedor que a alma não pode fazer outra coisa que converter-se em uma escrava obediente.coisa que converter-se em uma escrava obediente.
O plano de Deus para o espírito era que tivesse a preeminência, que governasse nossa alma. Mas uma vez que o homem se torna carnal, seu espírito fica escravizado à alma. A degradação aumenta quando o homem se torna «corporal» (do corpo), porque o corpo, que é mais baixo, sobe até ser o soberano.
Então o homem desceu do «controle do espírito» ao «controle da alma», e do «controle da alma» ao «controle do corpo». Cada vez se afunda mais e mais. Que lamentável é quando a carne consegue o domínio


* Aqui o espírito não é o Espírito Santo mas sim o espírito humano, porque vai precedido da palavra «natural», que literalmente é «anímico». Como «anímico» corresponde ao homem, então aqui «espírito» também corresponde ao homem. 
 

sexta-feira, 22 de março de 2013

OS ILLUMINATIS -os donos do mundo


O conflito entre o novo e o velho

É essencial a uma pessoa regenerada que compreenda o que obteve com o novo nascimento e o que persiste de seus dotes naturais. Esse conhecimento a ajudará em sua peregrinação espiritual. Neste ponto pode ser útil explicar tudo o que é entendido da carne do homem e também a maneira com que o Senhor Jesus trata com os componentes dessa carne, em sua redenção. Em outras palavras, o que herda um crente na regeneração?
A regeneração bíblica é um nascimento pelo qual a parte mais íntima do ser do homem, o espírito, profundamente oculto, é renovado e habitado pelo Espírito de Deus. Tem que passar um tempo até que o poder desta nova  vida alcance o exterior: ou seja, até que se estenda do centro até a circunferência. Por isso não podemos esperar encontrá-lo forte nos jovens nem a experiência dos pais, manifestadas na vida de um bebê em Cristo. Embora um crente recentemente nascido possa comportar-se fielmente, amando ao Senhor e distinguindo-se com seu zelo, ainda necessita tempo para ter ocasião de saber mais da maldade do pecado e do eu e para saber mais da vontade de Deus e dos caminhos do Espírito. Por muito que possa amar ao Senhor ou amar à verdade, este novo crente ainda anda no mundo dos sentimentos e dos pensamentos e ainda não foi provado nem refinado com fogo.
Um cristão recém-nascido não pode evitar ser carnal. Embora esteja cheio do Espírito Santo, mesmo assim não conhece a carne. Como pode alguém ser libertado das obras da carne se não reconhecer que essas obras nascem da carne? Por isso, considerando sua autêntica condição, os cristãos que são crianças recém-nascidas são em geral da carne.
A Bíblia não espera que os novos cristãos sejam espirituais instantaneamente, mas se depois de muitos anos continuam sendo crianças, então sua situação é verdadeiramente muito lamentável. Paulo mesmo diz aos coríntios que, no princípio, os tinha tratado como homens da carne porque eram meninos recém-nascidos em Cristo e que agora — quando lhes escrevia — deveriam ser já adultos. Em vez disso, tinham esbanjado suas vidas, continuavam sendo meninos e por isso ainda eram carnais.

quinta-feira, 21 de março de 2013


A salvação de Deus

O apóstolo afirma que «Deus tem feito o que a lei, debilitada pela carne, não podia fazer: enviando o seu próprio Filho na semelhança da carne de pecado, e no concernente ao pecado, condenou o pecado na carne» (Rm. 8:3). Isto revela a situação real da classe moral de quão carnais sejam, possivelmente estão muito resolvidos a observar a lei. É verdade que podem estar observando alguns de seus pontos. No entanto, debilitados pela carne, não podem observar toda a lei.* Porque a lei deixa muito claro que «o que fizer estas coisas, por elas viverá» (Gl. 3:12 mencionando Lv. 18:5) ou senão será condenado à perdição.
Alguém pode perguntar: Quanto da lei, tem que se observar? Toda a lei, porque «o que observa toda a lei, mas falha em um ponto, faz-se culpado de toda» (Tg. 2:10). «Porque nenhum ser humano será justificado a seus olhos pelas obras da lei, posto que da lei vem o conhecimento do pecado» (Rm. 3:20). quanto mais se deseja observar a lei, mais se descobre quão pecador é e quão impossível é observá-la.
A reação de Deus à pecaminosidade de todos os homens é ocupar-se Ele mesmo da tarefa da salvação. Seu método é «enviar a seu próprio Filho à semelhança da carne pecaminosa». Seu Filho é sem pecado, por isso é o único qualificado para nos salvar. A expressão: «À semelhança da carne pecaminosa» descreve sua encarnação: como toma um corpo humano e se une com a humanidade. O único Filho de Deus é mencionado em outro ponto como «o Verbo» que «se fez carne» (Jo. 1:14). Enquanto viveu na carne, permaneceu como Filho de Deus e sem pecado. Entretanto, como possui a semelhança da carne pecaminosa, está estreitamente unido aos pecadores do mundo que vivem na carne.
Como sacrifício pelo pecado, Cristo sofre por todos os que estão na carne. Mas e o poder do pecado que enche os carnais? «Condenou ao pecado na carne.» O, que é sem pecado, é feito pecado por nós para que morra pelo pecado. Ele é «morto na carne» (1 Pe. 3:18). Ao morrer na carne leva à cruz o pecado na carne. Isto é o que quer dizer a frase «condenou o pecado na carne». Condenar é julgar ou impor um castigo. O julgamento e o castigo do pecado é a morte. Por isso o Senhor Jesus dá morte ao pecado em sua carne. Por conseguinte, podemos ver em sua morte que não só são julgados nossos pecados mas também inclusive é julgado o próprio pecado. Assim,  o pecado já não tem nenhum poder sobre os que se uniram à morte do Senhor e em conseqüência têm o pecado condenado em sua carne.

A regeneração

A libertação do castigo e do poder do pecado, que Deus dá, se realiza na cruz de seu Filho. Agora põe esta salvação diante de todos os homens para que todo o que queira aceitá-la seja salvo.
Deus sabe que no homem não há nada bom. Nenhuma carne pode lhe agradar. Está corrompida sem possibilidade de reparação. Posto que é tão irremediável, como pode o homem agradar a Deus depois de ter acreditado, se Ele mesmo não lhe dá algo novo? Graças a Deus que outorgou uma vida nova, sua vida não criada, aos que acreditam na salvação do Senhor Jesus e O recebem como seu Salvador pessoal. Isto se chama «regeneração» ou «novo nascimento». Embora Deus não possa modificar nossa carne, nos dá sua vida. A carne do homem permanece tão corrupta nos que nasceram de novo como nos outros. A carne de um santo é tal e qual a de um pecador. Na regeneração, a carne não se transforma. O novo nascimento não exerce nenhuma influência sobre a carne. Permanece tal como é.
Deus não nos transmite sua vida para educar ou adestrar à carne. Ao contrário, a dá a nós para vencer a carne.
Na regeneração o homem passa a estar vinculado a Deus pelo novo nascimento. A regeneração significa nascer de Deus. De maneira que, nossa vida carnal nasce de nossos pais, nossa vida espiritual nasce de Deus. O significado do nascimento é «transmitir vida». Quando dizemos que nascemos de Deus, significa que recebemos uma nova vida dEle. O que recebemos é uma vida autêntica.



* É obvio que deveríamos observar que há outra classe, reconhecida em Romanos 8:7, que não se preocupa absolutamente de observar a lei de Deus: «a mente que está assentada na carne é hostil a Deus; não se submete à lei de Deus, seriamente não pode»).

. A carne e a salvação

A palavra «carne» é basar em hebreu e sarx em grego. É usada com freqüência na Bíblia e de diversas maneiras. O sentido mais significativo, observado e esclarecido nos escritos do Paulo, faz referência à pessoa não regenerada. Falando de seu velho «eu» diz em Romanos 7: «sou carnal» (v.14). Não simplesmente é carnal sua natureza ou uma determinada parte de seu ser. O «eu» — todo o ser de Paulo — é carnal. Reforça este pensamento no versículo 18 ao afirmar: «dentro de mim, quer dizer, em minha carne». Se deduz claramente que «carne» na Bíblia assinala a tudo o que é uma pessoa não regenerada. Em relação a este uso de «carne» temos que recordar que no princípio o homem foi feito espírito, alma e corpo. Como é a sede da personalidade e da consciência do homem, a alma está relacionada com o mundo espiritual por meio do espírito do homem. A alma deve decidir se tem que obedecer ao espírito, e por conseguinte estar unido a Deus e à sua vontade, ou se tem que ceder diante do corpo e de todas as tentações do mundo material. Na queda do homem, a alma se opôs à autoridade do espírito e ficou escravizada ao corpo e suas paixões. Deste modo o homem se converteu em um homem carnal, não em um homem espiritual. O espírito do homem foi despojado de sua nobre posição e foi rebaixado à de um prisioneiro. 
Assim, deveríamos destacar brevemente estas três outras maneiras de usar «carne» na Bíblia.
Primeira, «carne» referindo-se à parte branda do corpo humano. Sabemos que um corpo humano é composto de carne, ossos e sangue. A carne é a parte do corpo por meio da qual percebemos o mundo que nos rodeia. Por conseguinte uma pessoa carnal é uma que segue ao mundo. Vai ter simplesmente carne, vai atrás da sensação de sua carne.
Segunda, «carne» referindo-se ao corpo humano. Em termos muito amplos significa o corpo humano tanto vivo como morto. Segundo a última parte de Romanos 7, o pecado da carne está relacionado com o corpo humano: «vejo em meus membros outra lei em guerra com a lei de minha mente que faz-me cativo da lei do pecado que vive em meus membros» (v. 23). Em seguida, o apóstolo continua no capítulo 8 explicando que se queremos vencer a carne devemos «dar morte às ações do corpo» por meio do Espírito (v. 13). Por isso a Bíblia usa a palavra sarx para indicar não só a carne psíquica mas também a carne física.
Terceira, «carne» referindo-se à totalidade da humanidade. Todos os homens deste mundo são nascidos da carne, e em conseqüência todos são carnais. Sem nenhuma exceção, a Bíblia considera todos os homens carne. Todo homem é controlado pela composição da alma e do corpo que  chamamos carne, e vai atrás dos pecados de seu corpo e do eu de sua alma. Por isso sempre que a Bíblia fala de todos os homens, sua frase característica é «toda carne». Em conseqüência, basar ou sarx se referem aos seres humanos em sua totalidade.

Como o homem se torna carne?

1) O que é a carne?

«O que nasce da carne é carne.» O que nasce da carne? O homem. Por conseguinte o homem é carne, e tudo o que o homem herda de seus pais pertence à carne.
Não se faz distinção de se o homem for mau, ímpio, estúpido, inútil e cruel. O homem é carne. Todo o que o homem tem  ao nascer pertence à carne e se encontra dentro desse mundo. Tudo aquilo com que nascemos e o que desenvolvemos posteriormente fica incluído na carne.

2) Como o homem se torna carne?

«Todo o que nasce da carne é carne.» O homem não se torna carnal aprendendo a ser mau com uma prática progressiva do pecado, nem entregando-se a atos licenciosos, ávido de seguir o desejo de seu corpo e de sua mente até que finalmente todo ele é vencido e controlado pelas más paixões de seu corpo. O Senhor Jesus afirmou com ênfase que uma pessoa é carnal assim que nasce. Isto não é determinado nem por sua conduta nem por seu caráter. Há uma coisa que é decisiva neste ponto: de quem nasceu? Todo homem deste mundo foi engendrado de pais humanos e por conseguinte Deus o considera que é da carne (Gn. 6:3). Como pode alguém que nasce da carne não ser carne? Segundo a palavra de nosso Senhor, um homem é carne porque nasce do sangue, da vontade da carne e da vontade do homem (Jo. 1:13) e não pela maneira que viva ele ou seus pais.

3) Qual é a natureza da carne?

«O que nasce da carne é carne.» Não existe nenhuma exceção nem distinção. Nem a educação, nem as melhoras, nem a cultura, nem a moralidade ou a religião podem fazer que o homem deixe de ser carnal. Nenhuma ação ou poder humano pode modificá-lo. Se não for regenerado da carne, permanecerá como carne. Nenhum sistema humano pode fazer que deixe de ser o que era ao nascer. O Senhor Jesus disse «é», pelo que esse assunto ficou decidido para sempre. A carnalidade de um homem não vai ser determinada por ele mesmo, mas sim por seu nascimento. Se nascer da carne, todos os planos para sua transformação serão infrutíferos. Não importa como mude externamente; seja através de uma mudança diária ou de mudanças bruscas, o homem continua sendo carne tão firmemente como sempre.


A regeneração

O conceito de regeneração conforme o encontramos na Bíblia fala do processo de passar da morte para a vida. O espírito de um homem antes da regeneração está afastado de Deus e é considerado morto, porque a morte é a dissociação da vida e de Deus, que é a fonte da vida. Em conseqüência, a morte é a separação de Deus. O espírito do homem está morto e por conseguinte é incapaz de ter comunhão íntima com Ele. Ou sua alma o controla e o submerge em uma vida de idéias e imaginações, ou os desejos carnais e os costumes de seu corpo o estimulam e reduzem a sua alma à escravidão.
O espírito do homem tem que ser avivado porque nasceu morto. O novo nascimento de que falou o Senhor Jesus com Nicodemos é o novo nascimento do espírito. É obvio que não é um nascimento físico como acreditava Nicodemos, nem tampouco anímico. Devemos nos fixar cuidadosamente em que o novo nascimento transmite a vida de Deus ao espírito do homem. . O novo  nascimento é algo que acontece totalmente no espírito: não tem nenhuma relação com a alma ou o corpo.
A alma do homem não está relacionada diretamente com Deus. Segundo a Bíblia é seu espírito que tem relação com Deus. Deus é Espírito, e em conseqüência todos os que o adoram devem adorá-lo em espírito.
 Em vista deste fato, recordemos que Deus decretou que tratará com o homem unicamente por meio de seu espírito e que terá que levar a cabo seus conselhos por meio do espírito do homem.
 A vida de uma pessoa não regenerada está quase por inteira governada pela alma. Pode estar vivendo com temor, curiosidade, alegria, orgulho, piedade, prazer, delícia, estranheza, vergonha, amor, arrependimento, gozo. Ou pode estar cheia de ideais, imaginações, superstições, dúvidas, suposições, interrogações, induções, deduções, análise, introspecções. Ou pode ser impulsionada — pelo desejo de poder, reconhecimento social, riqueza, liberdade, posição, fama, glória, conhecimento — a tomar decisões atrevidas, a entrar pessoalmente em compromissos, a expressar opiniões obstinadas, ou inclusive a resistir a testes pacientemente.


O novo nascimento bíblico acontece em uma área muito mais profunda que o corpo ou a alma humana, sim, é no espírito do homem onde recebe a vida de Deus por meio do Espírito Santo.
Antes da regeneração, a alma do homem controla a seu espírito, enquanto seu próprio «eu» governa a sua alma e sua paixão governa a seu corpo. A alma se converteu na vida do corpo. Na regeneração, o homem recebe a própria  vida de Deus em seu espírito e nasce de Deus. Em conseqüência disso, agora o Espírito Santo governa o espírito do homem, que, por sua vez, é equipado para recuperar o controle sobre sua alma e, por meio da alma, governar seu corpo. Como o Espírito Santo se converte na vida do espírito do homem, este se converte na vida de todo o ser do homem. O espírito, a alma e o corpo são restaurados segundo o propósito original de Deus para toda pessoa nascida de novo.

Tem que usar sua fé para comprometer-se — seu espírito, alma e corpo — na união com o Senhor Jesus. Quer dizer, tem que considerar a morte do Senhor Jesus como sua própria morte e a ressurreição do Senhor Jesus como sua própria ressurreição. Este é o significado de João 3:16: «Todo aquele que nele (literalmente) crê, não pereça mas tenha vida eterna.» O pecador deve ter fé e acreditar no Senhor Jesus. Ao fazê-lo, se une a Ele em sua morte e ressurreição e recebe a vida eterna (Jo. 17:3) — que é a vida espiritual — para sua regeneração.

A regeneração

A libertação do castigo e do poder do pecado, que Deus dá, se realiza na cruz de seu Filho. Agora põe esta salvação diante de todos os homens para que todo o que queira aceitá-la seja salvo.
Deus sabe que no homem não há nada bom. Nenhuma carne pode lhe agradar. Está corrompida sem possibilidade de reparação. Posto que é tão irremediável, como pode o homem agradar a Deus depois de ter acreditado, se Ele mesmo não lhe dá algo novo? Graças a Deus que outorgou uma vida nova, sua vida não criada, aos que acreditam na salvação do Senhor Jesus e O recebem como seu Salvador pessoal. Isto se chama «regeneração» ou «novo nascimento». Embora Deus não possa modificar nossa carne, nos dá sua vida. A carne do homem permanece tão corrupta nos que nasceram de novo como nos outros. A carne de um santo é tal e qual a de um pecador. Na regeneração, a carne não se transforma. O novo nascimento não exerce nenhuma influência sobre a carne. Permanece tal como é.
Deus não nos transmite sua vida para educar ou adestrar à carne. Ao contrário, a dá a nós para vencer a carne.
Na regeneração o homem passa a estar vinculado a Deus pelo novo nascimento. A regeneração significa nascer de Deus. De maneira que, nossa vida carnal nasce de nossos pais, nossa vida espiritual nasce de Deus. O significado do nascimento é «transmitir vida». Quando dizemos que nascemos de Deus, significa que recebemos uma nova vida dEle. O que recebemos é uma vida autêntica.

LIVRO. O HOMEM ESPIRITUAL - Watchman Nee


O julgamento do Calvário

A morte entrou no mundo por meio da queda do homem. Aqui se faz referência à morte espiritual que separa o homem de Deus. Entrou por meio do pecado no princípio e continuou fazendo-o desde então. A morte sempre chega através do pecado. Notemos o que nos diz Romanos 5:12 sobre este assunto. Em primeiro lugar, que «o pecado entrou no mundo por meio de um homem». Adão pecou e introduziu o pecado no mundo. Segundo, que «a morte (entrou no mundo) através do pecado». A morte é o resultado invariável do pecado. E, finalmente, que como conseqüência «a morte se estendeu a todos os homens porque todos os homens pecaram». A morte não «se estendeu a» ou «passou aos homens simplesmente, mas sim literalmente «passou para todos os homens». A morte impregnou o espírito, o alma e o corpo de todos os homens. Não há nenhuma parte de um ser humano pela que não tenha passado.
Por isso é indispensável que o homem receba a vida de Deus. A salvação não pode chegar por uma reforma humana porque «a morte» é irreparável. O pecado tem que ser julgado antes de que possa haver resgate da morte para os homens. Isto é exatamente o que tem feito a salvação do Senhor Jesus.
Mas como o pecado está em sua humanidade, a morte do homem não pode expiar por seu próprio pecado. O Senhor Jesus veio e assumiu a natureza do homem, para poder ser julgado em lugar da humanidade. Não corrompida pelo  pecado, sua santa natureza humana pôde deste modo expiar pela humanidade pecadora por meio da morte. Morreu como substituto, sofreu todo o castigo do pecado e ofereceu sua vida como resgate por muitos. Como conseqüência, todo aquele que crê nEle já não será julgado (Jo. 5:24).
Quando o Verbo se fez carne, levava em si toda carne. Assim como a ação de um homem, Adão, representa a ação de toda a humanidade, a obra de um homem, Cristo, representa a obra de todos. Temos que ver quão completa é a obra de Cristo antes de poder compreender o que é a redenção. Por que o pecado de um homem, Adão, é julgado como o pecado de todos os homens passados e presentes? Adão é o cabeça da humanidade da qual vieram ao mundo todos os demais homens. De uma forma similar, a obediência de um homem, Cristo, faz-se justiça de muitos, passados e presentes, posto que Cristo constitui o cabeça de uma nova humanidade, originada por um novo nascimento.

Como a humanidade tem que ser julgada, o Filho de Deus — o homem Jesus Cristo — sofreu em seu espírito, alma e corpo sobre a cruz pelos pecados do mundo.
Examinemos primeiro seus sofrimentos físicos. O homem peca por meio de seu corpo, e neste desfruta do prazer temporário do pecado. Em conseqüência, o corpo tem que ser o destinatário do castigo. Quem pode sondar os sofrimentos físicos do Senhor Jesus na cruz?). Suas mãos, seus pés, sua testa, seu flanco, seu coração, todos foram transpassados pelos homens, transpassados pela humanidade pecadora e transpassados para a humanidade pecadora. Muitas foram suas feridas e muito lhe subiu a febre, porque com o peso de todo seu corpo pendurando na cruz sem nenhum apoio, seu sangue não podia circular livremente. Passou muita sede e por isso gritou: «A língua se me pega ao paladar.»  «Como tinha sede me deram vinagre para beber» (Sl. 22:15; 69:21). As mãos têm que ser cravadas porque vão atrás do pecado. A boca tem que sofrer porque sente prazer em pecar. Os pés têm que ser transpassados porque pecam à vontade. A testa tem que ser coroada com uma coroa de espinhos porque também quer pecar. Tudo o que o corpo humano tinha que sofrer se cumpriu em Seu corpo. Desta maneira sofreu fisicamente até a morte.
Estava em sua mão livrar-se destes sofrimentos, mas voluntariamente ofereceu seu corpo para suportar todas as insondáveis provações e dores sem acovardar-se nem um momento até que soube que «tudo estava consumado» (Jo. 19:28). Só então entregou seu espírito.
Não só seu corpo; sua alma também sofreu. A alma é o órgão da própria consciência. Antes de ser crucificado, deram a Cristo vinho misturado com mirra como calmante para mitigar a dor, mas Ele o rejeitou porque não estava disposto a aceitar nenhum sedativo mas sim a estar plenamente consciente do sofrimento. As almas humanas desfrutaram plenamente do prazer dos pecados; por conseguinte, Jesus ia suportar em sua alma a dor destes pecados. Preferiu beber a taça que Deus lhe deu do que a taça que anestesiaria sua consciência.

A Bíblia traz o relato de que os soldados ficaram a roupa do Senhor Jesus (Jo. 19:23). Estava quase nu quando o crucificaram. Esta é uma das vergonhas da cruz. O pecado nos tira nossa veste radiante e nos deixa nus. Nosso Senhor foi despido diante de Pilatos e logo depois de novo no Calvário. Como reagiu sua santa alma diante de semelhante mau trato? Acaso não era um insulto à santidade de sua personalidade e uma vergonha? Quem pode sondar seus sentimentos naquele trágico momento? Como todos os homens tinham desfrutado da glória aparente do pecado, o Salvador tinha que suportar a autêntica vergonha do pecado. «Verdadeiramente (Deus) cobriste-o de vergonha.... com que os teus inimigos, ó Senhor, têm difamado os passos do teu ungido.»; e até «suportou a cruz, desprezando a vergonha» (Sl. 89:45, 51; At. 12:2). 

Ninguém poderá jamais constatar o muito que sofreu a alma do Salvador na cruz. Contemplamos frequentemente seus sofrimentos físicos, mas passamos por cima dos sentimentos de sua alma. Uma semana antes da Páscoa o ouviram dizer: «Agora a minha alma está perturbada» (Jo. 12:27). Isto assinala a cruz. No Jardim do Getsêmani o ouviram de novo dizer: «A minha alma está triste até a morte» (Mt. 26:38). Se não fosse por estas palavras quase não poderíamos pensar que sua alma tinha sofrido.
 Seu espírito também sofreu terrivelmente. O espírito é a parte do homem que o equipa para comunicar-se intimamente com Deus. O Filho de Deus era santo, inocente, imaculado, separado do pecado. Seu espírito estava unido ao Espírito Santo em perfeita unidade. Nunca teve seu espírito um momento de perturbação nem de dúvida, porque sempre teve a presença de Deus com Ele. Jesus disse: «Não sou eu só, mas eu e o Pai que me enviou... E aquele que me enviou está comigo» (Jo. 8:16, 29). Por isso pôde orar: «Pai, graças te dou, porque me ouviste. Eu sabia que sempre me ouves» (Jo. 11:41,42).Por um lado, o Espírito Santo de Deus o abandonou. Por outro, o espírito diabólico de Satanás o ridicularizou. Parece que o Salmo 22:11-13 se refere a esta fase: «Não te alongues de mim, pois a angústia está perto, e não há quem acuda. Muitos touros me cercam; fortes touros de Basã me rodeiam. Abrem contra mim sua boca, como um leão que despedaça e que ruge..»
Agora nossa humanidade pecadora foi julgada totalmente porque foi julgada na humanidade sem pecado do Senhor Jesus. Nele, a humanidade santa conquistou sua vitória. Toda sentença sobre o corpo, a alma e o espírito dos pecadores foi lançada sobre Ele. Ele é nosso representante. Por fé estamos unidos a Ele. Sua morte é considerada como nossa morte, e sua sentença como nossa sentença. Nosso espírito, alma e corpo foram julgados e castigados nele. Seria o mesmo que se tivéssemos sido castigados em pessoa.