segunda-feira, 28 de maio de 2012


As musas dos escândalos

Mulher de Carlinhos Cachoeira, Andressa Mendonça provoca furor na CPI e confirma a tradição do surgimento de beldades em meio aos grandes casos de corrupção no País

Claudio Dantas Sequeira
chamada.jpg
 A empresária goiana Andressa Mendonça arrancou suspiros dos parlamentares em sessão
da CPI e, entre olhares e poses para os fotógrafos, foi naturalmente alçada à musa
Na terça-feira 22, durante audiência de Carlinhos Cachoeira na CPI que leva seu nome, outra personagem dividia as atenções de políticos, jornalistas e curiosos: Andressa Alves Mendonça, a mulher do bicheiro. Esguia, loura de olhos claros, a empresária goiana de 30 anos foi alçada ao posto de “Musa da CPI”. Ela chegou ao Congresso causando furor, sempre acompanhada de seguranças. Elegantemente vestida num conjunto de blusa branca acinturada, calça preta e escarpim, bolsa Chanel a tiracolo, usava óculos escuros e relógio de grife. Orientada pelos advogados, fez poucas declarações. No auditório, foi colocada em uma das bancadas de parlamentares, junto com a irmã de Cachoeira, perto do senador Fernando Collor (PTB-AL). A troca de olhares entre ela e o contraventor foram percebidas por deputados e senadores. “A cada negativa de resposta ele olha para ela com superioridade e é correspondido com um sorriso. Lindo!”, ironizou o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ). Na saída, mais confusão. Na tentativa de arrancar alguma declaração de Andressa, repórteres e cinegrafistas se acotovelaram, tropeçando nos fios. Enigmática, ela considerou “ótimo” o resultado da audiência.

Não é de hoje que belas mulheres surgem no rastro de escândalos políticos. Há cerca de dois anos, a prisão do então governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, alvo da operação Caixa de Pandora, acabou lançando holofotes sobre sua mulher, a jovem Flávia Peres, que animou o noticiário com suas visitas de rotina à sede da PF, onde ele ficou detido por dois meses. Assim como Andressa, Flávia manteve a discrição para não prejudicar o marido e voltou ao anonimato tão logo ele foi solto. Bem diferente foi o que aconteceu com as jornalistas Mônica Veloso e Camila Amaral. A primeira foi pivô do escândalo apelidado de “Renangate”, em 2007. O caso trouxe à tona não apenas o affair extraconjugal do senador Renan Calheiros, mas sua relação pouco ortodoxa com o lobista Claudio Gontijo, ligado à empreiteira Mendes Júnior. Era Gontijo quem pagava, a pedido de Renan, a pensão alimentícia por conta do filho que tiveram. Com a repercussão do caso, Mônica posou nua para uma revista masculina.

Já Camila Amaral foi descoberta durante a CPI do Mensalão, em 2005, quando fazia a assessoria de imprensa da senadora Ideli Salvatti (PT-SC). Então com 25 anos, em meio ao assédio, acabou trocando o emprego no gabinete de Ideli por um contrato para posar nua. Outra musa que tirou o fôlego dos parlamentares foi Thereza Collor. Casada com Pedro, irmão de Fernando Collor de Mello, durante o escândalo PC Farias, que levaria ao impeachment do então presidente, ela ganhou apelidos como “cunhadinha do Brasil” e “tigresa de Maceió”. Nunca posou nua, mas alimentou o imaginário de deputados e senadores ao abusar da sensualidade, com minissaias justíssimas, nas aparições no Congresso.

Na opinião do cientista político Leonardo Barreto, da UnB, a sociedade tem uma queda pelo pitoresco, pelo bizarro, o que explica a obsessão por eleger musas em meio a escândalos políticos. “A gente procura detalhes, histórias que possam ilustrar esses casos e dar uma leveza. Para um público que não tem o hábito de acompanhar a política, esse tipo de coisa acaba chamando mais a atenção”, avalia Barreto.

Apelidada de “Andressa Caça-Níquel”, num trocadilho infame associado à atividade do marido, a loura jura que não posará nua, ao menos por enquanto. Ela contou que recusou um convite da “Playboy”. “Eu agradeci e disse que meu papel, no momento, não é esse.” Dona de uma loja de lingerie e sex shop em Goiânia, Andressa tem sido orientada pelos advogados a manter discrição. Pesa o fato de ela ter deixado o casamento de oito anos com o empresário Wilder Pedro de Morais, 43 anos, com quem tem dois filhos, para cair nos braços do bicheiro, com quem está há nove meses. “Carlinhos é o homem da minha vida”, diz ela. Wilder é suplente do senador Demóstenes Torres, amigo e sócio do contraventor. Corre o boato de que Andressa e Carlinhos Cachoeira já trocavam carícias escondidos enquanto ela era casada com Wilder. Ela garante que não. Natural de Itumbiara e crescida em Goiatuba, Andressa, em sua lógica própria, diz que admira o marido ainda mais hoje que antes. “A gente sabe que isso é uma tempestade e vai passar.” É difícil. Flagrada em conversas com Cachoeira sobre seus negócios, Andressa corre o risco de ser convocada em breve pela CPI para contar o que sabe.
img5.jpg


Há excesso de exames?

Nova pesquisa esquenta o debate sobre a realização desnecessária de exames de diagnóstico, colocando em xeque até que ponto eles são realmente benéficos à saúde

Mônica Tarantino
img.jpg
A realização excessiva de exames é vista hoje como um dos mais graves problemas da saúde pública. Além dos custos elevados, há um questionamento sobre o impacto real desses testes na mortalidade. Na semana passada, mais um dado voltou a agitar a discussão. Médicos que compõem a Força-Tarefa para Serviços Preventivos dos Estados Unidos, uma comissão não governamental composta de especialistas independentes, causaram polêmica ao desaconselhar a realização do exame de PSA (antígeno prostático específico), para diagnóstico do câncer de próstata, na população em geral.

O grupo concluiu que o teste periódico entre os homens de maneira indistinta poderia gerar mais danos do que benefícios. Levaria ao excesso de diagnósticos de tumores de evolução lenta que provavelmente não provocariam sintomas ou não causariam a morte. Também permitiria uma exposição desnecessária a tratamentos que têm como efeitos colaterais a incontinência urinária ou impotência para cerca de 30% dos pacientes. A dedução, publicada na revista científica “Annals of Internal Medicine”, está baseada em dois grandes estudos feitos nos Estados Unidos e em sete países da Europa. O trabalho não apontou redução na mortalidade entre os homens que fizeram o PSA.

O anúncio causou polêmica. “Os dados dos estudos nos quais eles se baseiam precisam ser mais bem examinados”, diz o oncologista Gustavo Guimarães, diretor do Núcleo de Urologia do Hospital A.C. Camargo, em São Paulo. “Até lá, a recomendação da Sociedade Americana de Câncer parece ser a mais sensata: homens acima de 50 anos sem fatores de risco devem decidir com seus médicos se querem ser avaliados.” Além disso, o médico argumenta que há escalas para classificar os tumores de próstata que subsidiam os oncologistas nas situações em que é possível discutir com o paciente se é preferível tratar ou apenas acompanhar a evolução do tumor.

Para o oncologista Paulo Hoff, diretor de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês e do Instituto do Câncer de São Paulo, é necessário esclarecer que o alvo das recomendações da força-tarefa americana são as políticas de saúde pública. “Elas são observações do impacto populacional desses exames quando feitos rotineiramente. No âmbito individual, se o médico entender que o PSA é necessário para o seu paciente, as seguradoras e o sistema de saúde americanos continuam pagando a realização do teste”, diz Hoff. “Eu discuto as possibilidades com o paciente, mas a minha tendência é pedir o PSA”, afirma o médico.
img1.jpg
"A minha tendência é pedir o exame PSA,
que detecta o câncer de próstata"

Paulo Hoff, oncologista
Anteriormente, outra comissão americana colocou em xeque a eficácia da mamografia de rotina. De acordo com especialistas, só um pequeno número de mulheres que tiveram seus tumores diagnosticados pelo exame de rastreamento, feito anualmente, foram salvas pela detecção precoce. Novamente, porém, há controvérsias em relação ao resultado. Um estudo realizado na Suécia com mais de um milhão de mulheres na faixa dos 40 a 49 anos, acompanhadas por um tempo médio de 16 anos, mostrou que fazer mamografia nesse período reduz a mortalidade. Em países onde a mamografia não é amplamente acessível, como o Brasil, a mortalidade é alta. Para este ano, estima-se o surgimento no País de 50 mil novos casos e o registro de dez mil mortes causadas pela doença. “Recomendo que as mulheres façam mamografia todo ano a partir dos 40. Isso porque os tumores mais agressivos são mais comuns em mulheres mais jovens”, diz o oncologista Sérgio Simon, do Hospital Israelita Albert Einstein e do Centro Paulista de Oncologia.

O questionamento do excesso de testes vai além dos exames para câncer. Recentemente, nove sociedades americanas lançaram uma lista na qual recomendam que 45 testes sejam solicitados com mais rigor e menos frequência. Entre eles a realização de tomografias para casos de sinusite ou dores de cabeça. No campo da cardiologia são citados procedimentos como eletrocardiogramas, cintilografia, ecocardiografia ou a ressonância por stress – testes em que ocorre a injeção de substância para analisar o coração em condições de má oxigenação. “São testes muitas vezes incluídos de forma desnecessária em check-ups anuais em pacientes sem sintomas, por exemplo”, diz Evandro Tinoco Mesquita, da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Um dos riscos é submeter os indivíduos a doses desnecessárias de radiação.

O médico está avaliando se o exame ecodopplercardiografia (ultrassom do coração) está sendo indicado de forma apropriada nos hospitais da Universidade Federal Fluminense e no Pró-Cardíaco, ambos no Rio de Janeiro. Um dos problemas do uso inadequado é a elevação dos custos. “Precisamos caminhar para o uso mais racional e eficiente dos recursos”, diz Mesquita. “É uma tendência em todo o mundo.”
img2.jpg
  • Raio laser contra a celulite

    Já aprovado nos EUA e na Europa, aparelho faz sucesso entre médicos e pacientes com a promessa de acabar com o problema

    Tamara Menezes
    Toda mulher que tentou algum tratamento contra a celulite sabe quanto é difícil combatê-la. Por isso, está causando tanta expectativa o anúncio de um novo aparelho criado nos Estados Unidos que promete acabar com o efeito de “casca de laranja” na pele. Chamado Cellulaze, o equipamento foi aprovado pelo Food and Drug Administration, órgão americano responsável pela liberação de recursos da área de saúde, com eficácia reconhecida para um período de três meses. O aparelho também obteve o CE Mark, selo que atesta conformidade com as regras europeias. A previsão é que chegue ao Brasil no ano que vem.

    O equipamento realiza disparos de raio laser dentro da derme, nos pontos em que existem os nódulos e fibroses responsáveis pelas depressões na pele. A explicação é a de que o laser romperia as fibras. “O aspecto da região tratada muda imediatamente”, afirma o dermatologista Samir Arbache, de São José dos Campos, em São Paulo. Ele assistiu a uma aplicação nos Estados Unidos e pretende trazer a novidade. O Cellulaze também estimularia a produção de colágeno – proteína que ajuda na sustentação da pele – e ajudaria a cauterizar microvasos sanguíneos aparentes.

    Apesar do sucesso – até agora, cerca de 200 médicos nos EUA já estão usando o aparelho – e do aval do FDA atestando sua capacidade de sumir com a celulite por pelo menos três meses, há dúvidas sobre o verdadeiro potencial do Cellulaze. Hoje, já existe a técnica de laser lipólise, que quebra as células de gordura por meio do calor emitido pelo raio. “Mas ela não costuma ser indicada para celulite”, diz Roberto Adilson de Mattos, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia. O equipamento, porém, atingiria mais as fibroses, sem necessariamente destruir as células de gordura.

    Especialistas também argumentam que a tecnologia não trata as causas do problema, associadas aos hormônios femininos. “Por isso não acredito no resultado definitivo”, diz Valcinir Bedin, presidente da regional paulista da Sociedade Brasileira de Medicina Estética. De fato, há poucos estudos científicos que apontam quanto tempo dura o efeito. Pesquisa do médico americano Barry DiBernardo, publicado na revista “Aesthetic Surgery Journal” mostrou permanência do resultado por seis meses. Foi o melhor resultado cientificamente comprovado. Outro obstáculo é o preço. O tratamento de uma região equivalente à palma de uma mão não sai por menos de US$ 2,5 mil (cerca de R$ 5 mil).
    img.jpg










    Raio laser contra a celulite

    Já aprovado nos EUA e na Europa, aparelho faz sucesso entre médicos e pacientes com a promessa de acabar com o problema

    Tamara Menezes
    Toda mulher que tentou algum tratamento contra a celulite sabe quanto é difícil combatê-la. Por isso, está causando tanta expectativa o anúncio de um novo aparelho criado nos Estados Unidos que promete acabar com o efeito de “casca de laranja” na pele. Chamado Cellulaze, o equipamento foi aprovado pelo Food and Drug Administration, órgão americano responsável pela liberação de recursos da área de saúde, com eficácia reconhecida para um período de três meses. O aparelho também obteve o CE Mark, selo que atesta conformidade com as regras europeias. A previsão é que chegue ao Brasil no ano que vem.

    O equipamento realiza disparos de raio laser dentro da derme, nos pontos em que existem os nódulos e fibroses responsáveis pelas depressões na pele. A explicação é a de que o laser romperia as fibras. “O aspecto da região tratada muda imediatamente”, afirma o dermatologista Samir Arbache, de São José dos Campos, em São Paulo. Ele assistiu a uma aplicação nos Estados Unidos e pretende trazer a novidade. O Cellulaze também estimularia a produção de colágeno – proteína que ajuda na sustentação da pele – e ajudaria a cauterizar microvasos sanguíneos aparentes.

    Apesar do sucesso – até agora, cerca de 200 médicos nos EUA já estão usando o aparelho – e do aval do FDA atestando sua capacidade de sumir com a celulite por pelo menos três meses, há dúvidas sobre o verdadeiro potencial do Cellulaze. Hoje, já existe a técnica de laser lipólise, que quebra as células de gordura por meio do calor emitido pelo raio. “Mas ela não costuma ser indicada para celulite”, diz Roberto Adilson de Mattos, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia. O equipamento, porém, atingiria mais as fibroses, sem necessariamente destruir as células de gordura.

    Especialistas também argumentam que a tecnologia não trata as causas do problema, associadas aos hormônios femininos. “Por isso não acredito no resultado definitivo”, diz Valcinir Bedin, presidente da regional paulista da Sociedade Brasileira de Medicina Estética. De fato, há poucos estudos científicos que apontam quanto tempo dura o efeito. Pesquisa do médico americano Barry DiBernardo, publicado na revista “Aesthetic Surgery Journal” mostrou permanência do resultado por seis meses. Foi o melhor resultado cientificamente comprovado. Outro obstáculo é o preço. O tratamento de uma região equivalente à palma de uma mão não sai por menos de US$ 2,5 mil (cerca de R$ 5 mil).














A rotina dos popstars da fé

Divididos entre religião e carreira, família e viagens, missas e shows, esses campeões de vendas se desdobram para equilibrar o divino e o mundano no dia a dia

João Loes e Rodrigo Cardoso
Assista ao vídeo e conheça as músicas dos astros da fé:
religiosos_site.jpg  
 abre.jpg
Eles detestam ser chamados de estrelas. Repetem, insistentemente, que são, na melhor das hipóteses, um mero canal para a graça de Deus. A humildade do discurso, porém, contrasta com a postura de celebridade desses ídolos cristãos e com os números que compõem este que já é o mais expressivo segmento do mercado fonográfico do País. Estima-se que, só em 2011, a produção de discos e DVDs religiosos no Brasil rendeu R$ 1,5 bilhão. Como não poderia deixar de ser, no mesmo ano, os discos e os DVDs mais vendidos, segundo a Associação Brasileira dos Produtores de Discos (Abpd), foram dos astros da fé padre Marcelo Rossi e padre Fábio de Melo, respectivamente.
img.jpg
AMIGOS
Padre Marcelo e padre Fábio na gravação do
DVD “Ágape”, em São Paulo, no domingo 20
O domínio não é só católico. Estrelas do mundo gospel têm tido cada vez mais espaço para brilhar. Pudera, hoje o Brasil tem pelo menos 38 milhões de evangélicos, segundo dados do Centro de Pesquisas Sociais da Fundação Getulio Vargas (CPS/FGV). Nomes como Aline Barros, Ana Paula Valadão e Regis Danese são verdadeiras potências capazes de arrastar centenas de milhares de pessoas a shows, cruzar barreiras religiosas e vender milhões de discos e DVDs. “E tem uma outra coisa – para os evangélicos, pirataria é roubo e roubo é pecado”, afirma o evangélico Danese. Como consequência, as perdas para a pirataria de gravadoras especializadas nesse mercado não passam de 15% do faturamento, enquanto para as outras o percentual pode chegar a até 60%.

Mas como vivem essas pessoas, divididas entre a pureza da mensagem divina e a lógica violenta do mercado? Como administram fé, carreira artística, vida religiosa, família, viagens, fãs, sucesso e dinheiro? ISTOÉ ouviu cinco dos mais importantes representantes do gênero na atualidade, além de gente do seu círculo social, para a seguir mostrar as alegrias, tristezas, paixões e dúvidas dos astros da fé.
img2.jpg
"Gosto de roça, de bicho. Em casa tenho pouquíssimos ruídos"
Padre Fábio de Melo

Um mês atrás, padre Fábio de Melo desabafou em seu Twitter que, cansado da cidade grande, qualquer dia venderia seu iPhone e compraria um casal de gansos. Aos 42 anos, o sacerdote que nasceu em Formiga, interior de Minas Gerais, e atravessou fronteiras graças aos cerca de 30 produtos que lançou no mercado – entre CDs, DVDs e livros –, mora sozinho em um sítio numa região rural de Taubaté, interior de São Paulo. É lá, ao lado dos dois cachorros, o mastiff inglês Nathan e o bulldog francês Lucca, que ele relaxa. “Gosto de roça, de bicho. Em casa tenho pouquíssimos ruídos urbanos por perto”, afirma o sexto maior vendedor de CDs do Brasil no ano passado. No momento, o sacerdote cantor que já vendeu dois milhões de CDs e 700 mil DVDs afirma: “Estou cada vez menos urbano.”

Apesar do discurso desapegado, padre Fábio ainda não se livrou de seu smartphone. Também não abre mão de dirigir o próprio carro na ida ao supermercado. Até já arriscou uma volta em um modelo stock car, como mostra a foto acima, em 2010, um desejo antigo. Mas cavalgar, cuidar pessoalmente dos cachorros e ajudar na limpeza da casa e do jardim são seus principais passatempos quando encontra uma folga na agenda tomada – entre celebrações e um programa de rádio – por 100 shows anuais e pelo menos um lançamento de CD ou DVD por ano. “Com essa rotina, ficar em casa é sempre um luxo”, diz o sacerdote. Vestindo batina, o caçula de oito filhos explodiu como um fenômeno da música gospel no início dos anos 2000. “A vocação espiritual do Fábio era a de um padre, mas a vocação natural era a de um artista. Sendo assim, que se tornasse um padre artista”, afirma o padre João Carlos Almeida, diretor da Faculdade Dehoniana e formador espiritual, musical e universitário do sacerdote mineiro. 

Padre Fábio aprendeu direitinho com seu mentor. A timidez e a melancolia do início da carreira saíram de cena e o mineiro boa-pinta de olhar triste conquistou o público se valendo de uma linguagem comum ao ambiente acadêmico – própria de quem se formou em teologia e filosofia, fez pós-graduação e lecionou em faculdades. “Fábio não é padre que faz sermão em igreja. Em qualquer lugar que ele vá seu discurso é estudado”, afirma padre Almeida. “Ele é um poeta do evangelho”, diz o pré-candidato a prefeito de São Paulo Gabriel Chalita, que publicou dois livros em parceria com o amigo religioso. Um poeta que, além da articulação das palavras, zela pela aparência. Ela, afinal, também tem o dom de cativar fãs fiéis. “Vou regularmente ao dermatologista. Já tive câncer de pele e uma paralisia facial na juventude. E procuro controlar o peso”, afirma ele. “Eu me cuido, sim. Estar bem-vestido faz parte do meu trabalho. É uma hipocrisia achar que o padre precisa andar mal-arrumado e desleixado.”
img4.jpg
"Trocaria meu corpo por três de 18 anos"
Padre Marcelo Rossi

Padre Marcelo Rossi, 45 anos, estava pronto. Na tarde do domingo 20, de batina branca, ele rumou para a cripta que fica embaixo do enorme palco do Santuário Theotókos Mãe de Deus, em construção há oito anos. Ali, seu corpo repousará em sono eterno quando sua missão na terra acabar. O momento era de oração. Todos estavam em corrente vibrando para que a gravação do DVD “Ágape”, que começaria alguns lances de escada acima e dali a pouco mais de uma hora, corresse bem. “Dava pra sentir a energia no ar”, diz um membro da equipe musical. E que energia! Uma multidão de 45 mil fiéis já se aglomerava diante do palco do santuário para acompanhar a gravação e se fazia ouvir, através do concreto da cripta, com poderosos gritos de Jesus.

Seria ingênuo pensar que padre Marcelo já se acostumou com eventos como esse. E, mesmo que tivesse se acostumado, este certamente teria sabor diferente. O DVD “Ágape” é um desdobramento do sucesso inédito e retumbante do religioso no mercado editorial com o livro de mesmo nome lançado em 2010, que já vendeu oito milhões de cópias. “Minha vida está uma loucura, uma correria, mas uma bênção”, diz ele. Até agosto, de segunda a quarta, sua agenda está tomada por sessões de autógrafo em 12 cidades brasileiras. Em meio a esse stresse, ele faz o que pode para manter a rotina. Acorda sempre entre as três e quatro da manhã, faz uma breve oração, não toma café e mergulha nos afazeres diários, que incluem uma entrada ao vivo em rádio, obrigações com a obra no santuário e cuidados com a saúde. “Procuro fazer esteira e fisioterapia quatro vezes por semana”, diz.

Em 2010, depois que sofreu um grave acidente na mesma esteira que usa hoje, padre Marcelo chegou a celebrar missas em cadeira de rodas. A queda lhe rendeu um pé quebrado, tendões rompidos e um insistente problema no joelho que ainda teimam em incomodá-lo. Para amenizar as dores, o religioso tem alternado quatro pares de tênis do tipo esportivo, desenhado para amortecer impactos. Membros da equipe de filmagem da Rede Vida, que transmite suas missas há anos, e voluntários mais antigos que trabalham organizando a multidão nas celebrações em São Paulo dão como certa a ingestão de remédios pelo padre, tanto para dor quanto para inflamação. Isso poderia explicar, em parte, a dificuldade que ele tem tido em se mexer com agilidade e o visível inchaço de seu rosto. “Só com muita fé para fazer o que ele faz com as dores que deve sentir”, disse uma pessoa próxima, que revelou ainda que o popstar católico não pisa num supermercado, restaurante ou cinema há anos. “Não tem jeito, junta uma multidão pra ver, tocar, tirar foto e pedir bênção.”

Sobre o fervor dos fiéis, Marcelo lembra de uma história divertida. “Uma vez, uma senhora me viu dirigindo e começou a me fechar até que eu tive que subir, literalmente, na calçada e parar o carro”, diz ele. “Ela desceu, se ajoelhou e pediu uma bênção”, conta. Desde então ele não dirige mais e conta com o fiel Chicão, motorista e faz-tudo, para ajudá-lo a se deslocar. Quando questionado sobre o que espera do futuro, dá sinais de que o cansaço físico já começou a pesar. “Nos próximos cinco anos me vejo com mais experiência”, diz. “Mas trocaria meu corpo por três de 18 anos.”
img6.jpg
"Acompanho o dever de casa do Nicolas, o levo para a
escola, alimento e dou banho na Maria Catherine"

Pastora Aline Brarros
Nicolas sobe as escadas de casa chorando. No andar de cima, sua mãe, a pastora, cantora e escritora Aline Barros, interrompe a conversa telefônica para acalmar o primogênito de 8 anos, que está usando aparelho nos dentes. “Deixa a mamãe ver. Onde está doendo?”, diz. Aos 35 anos, a maior expoente feminina da música gospel brasileira tem hoje os filhos mais perto de si do que os microfones com os quais se tornou fenômeno da indústria fonográfica. Sete meses atrás, Aline deu à luz Maria Catherine e, desde então, a maternidade sobrepujou a sua rotina artística. Foi só em março, após seis meses dedicados exclusivamente à filha, que a cantora retomou os compromissos no show biz. “Minhas manhãs ainda são para os meus filhos. Acompanho o dever de casa do Nicolas, o levo para a escola, alimento e dou banho na Maria Catherine”, diz a pastora da Igreja Comunidade Evangélica Internacional da Zona Sul, no Rio de Janeiro, frequentada por ela toda quarta e domingo. 

Desde 1995, quando lançou o primeiro de 27 álbuns, a evangélica já vendeu cerca de seis milhões de cópias e ganhou quatro Grammys latinos (o último no ano passado). Aline foi a primeira cantora gospel do País a conquistar um Grammy, em 2004. A gravação do álbum premiado, “Fruto de Amor”, foi cercada de muita tensão. Na época, um problema nas cordas vocais provocava rouquidão na pastora e só lhe permitia gravar depois de uma longa pausa de recuperação. “Procurei uma fonoaudióloga, que me disse que eu estava com apenas 5% da voz em perfeitas condições”, lembra. 

Com a voz recuperada, a pastora iria cantar para cerca de dez mil pessoas no Maracanãzinho, no Rio de Janeiro, no sábado 26. Onipresente em programas de tevê fora do segmento cristão e amparada por números de uma estrela, com músicas gravadas em espanhol, a carioca que cresceu no subúrbio da Vila da Penha e hoje vive no confortável bairro da Barra da Tijuca não se veste com o manto comum às celebridades. “Se deixar, a Aline passa o dia de jeans e tênis”, revela a sua mãe, Sandra Barros. “Ela é despojadona.” De fato, a pastora cantora já esteve em três programas de tevê diferentes, em uma mesma semana, calçando o mesmo sapato.

A evangélica se policia para não fazer a vida girar em torno da carreira. Seu marido, o ex-jogador de futebol Gilmar dos Santos, com quem está há 12 anos, revela um pacto feito pelo casal. “Desde que nos casamos, acertamos que não permitiríamos que a nossa vida ficasse refém de uma agenda.” Hoje, quando tem de viajar de avião para alguns dos 110 shows que faz por ano, ela carrega a filha no colo e procura embarcar em voos próximos ao horário dos shows. Inspirada pela fase materna, Aline planeja montar uma loja de roupas infantis. “Eu visto a Maria Catherine três vezes por dia, só para ficar namorando suas roupinhas”, diz.
img8.jpg
"Hoje, meu foco é minha filha"
Regis Danese
A rotina de shows já foi mais puxada para Regis Danese, nascido João Geraldo Danese Silveira em 2 de abril de 1972, na cidade de Passos, interior de Minas Gerais. Até 2010, quando vivia o auge do sucesso da música “Faz um Milagre em Mim”, que o consagrou no mercado gospel, o pacato mineiro se desdobrava para cumprir uma agenda de shows que chegava a ter 40 apresentações em um mês. A música, de 2008, é tida pela indústria fonográfica evangélica como a responsável por romper importantes barreiras. Foi das primeiras a ser tocada livremente em rádios FM laicas, a ser gravada por padres católicos e a ganhar dezenas de versões. Foram 50 mil discos vendidos no primeiro mês de lançamento e um milhão em menos de um ano. “Graças a ela, fazíamos três shows em uma noite só”, diz Danese, que vive em Belo Horizonte.

Hoje, o ritmo de shows diminuiu, mas ainda está longe de ser tranquilo. São cerca de oito apresentações por mês. E, onde quer que esteja, Danese, como bom evangélico, está sempre com sua “Bíblia” – a mesma, aliás, desde sua conversão, em 2000. Durante os voos para os locais de show, muitas vezes em pequenos aviões particulares, ela é lida com mais fervor. O artista admite que tem um medo saudável do aparelho. “Uma vez pegamos uma tempestade em um aviãozinho de duas hélices que chacoalhava tanto que nem a Bíblia eu consegui ler, então comecei a cantar”, lembra ele.

A voz, instrumento de trabalho e de fé, é cuidada com esmero. Só não recebe mais atenção que o cabelo, sempre espetado. São pelo menos 30 minutos de preparo, com sprays e produtos para garantir o efeito conhecido pelos fãs. “Às vezes, quando não tem cabeleireiro, eu ajudo, mas não fica lá essas coisas”, brinca Evander Domingues, o Vandinho, violonista da banda de Danese e amigo dos tempos em que ambos ainda eram membros do grupo de pagode Só Pra Contrariar.

É de Vandinho, da fé inabalável e da família que Regis tem tirado forças para encarar o mais recente desafio que a vida lhe jogou: a leucemia da filha mais nova, Brenda, 3 anos. Em viagem para a Disney, nos Estados Unidos, no mês de janeiro, a menina começou a passar mal, estava anêmica, muito branca e cheia de manchas roxas pelo corpo. Em visita a um hospital de Orlando, foi internada imediatamente e teve de receber uma transfusão de emergência. “Ela estava praticamente sem sangue”, diz Kelly Danese, mulher de Regis. Hoje, o tratamento quimioterápico pelo qual a menina passa em Belo Horizonte mudou a rotina da família. 

O astro gospel já não joga mais seu futebolzinho semanal e pouco se diverte. “Todo o tempo livre que ele tem passa em casa olhando para a Brenda e orando”, diz Kelly. Um DVD, que seria gravado no mês que vem pelo astro, foi cancelado. Os shows, porém, continuam. Quando está fora, ele liga mais de cinco vezes por dia para saber notícias. “Hoje, meu foco é minha filha”, diz Danese.
img10.jpg
"Nem o sucesso da missão justifica o fracasso da família"
Ana Paula Valadão

“Vai com Deus, porque quando você cantar o ladrão não vai mais ser ladrão.” A frase dita pelo precoce Isaque Valadão, 6 anos, é o que move Ana Paula Valadão, mãe do garoto e vocalista da banda Diante do Trono, um fenômeno da música gospel que existe há 15 anos e já vendeu mais de dez milhões de discos. Quando as obrigações da carreira musical atropelam a rotina dessa mineira de Belo Horizonte, é na frase de Isaque que ela pensa. “É a garantia que tenho de que estou no caminho que Deus quer pra mim”, diz Ana, 36 anos, integrante, ao lado da família, da Igreja Batista da Lagoinha. “Ela encara a carreira e os sacrifícios exigidos como missão divina”, diz a irmã, Mariana Valadão. E espera seriedade, compromisso e abdicação semelhantes de todos de sua equipe. Atualmente, por exemplo, os 16 membros do Diante do Trono estão no que ela chama de “jejum de delícias” em preparo para a gravação do 15o disco da banda, marcada para acontecer no dia 9 de junho. Durante os 40 dias que antecedem a apresentação, cada um deve cortar do cardápio três ou quatro alimentos que come por puro prazer. “O rigor é tanto que ela chega a proibir, nos hotéis, que a equipe assista à televisão ou use a piscina antes de fazer uma apresentação”, diz o irmão, André Valadão, outra estrela do mundo gospel.
img1.jpg
FERVOR
Dezenas de milhares de pessoas acompanham as celebrações de padre Marcelo
Comunicar-se com familiares, porém, está liberado. Ela está sempre em contato com os dois filhos e o marido pelo iPhone. Usando um aplicativo que permite a troca gratuita de mensagens de texto e imagens, manda e recebe notícias constantes. Na última viagem, por exemplo, o companheiro mandou fotos de Isaque e do irmão, Benjamin, 3 anos, depois do banho, vestidos com o uniforme da escola e na hora de dormir, aconchegados no canto dela da cama de casal. Já ela fotografou o quarto do hotel e a roupa que escolheu para se apresentar. “Para eles verem como a mamãe está”, diz ela. Quando volta, ela lê e assina todos os recados mandados pelas professoras sobre seus meninos e faz questão de levá-los ao colégio sempre que está em Belo Horizonte. “Nem o sucesso da missão justifica o fracasso da família”, afirma.

Paciente com os fãs, Ana Paula encara a rotina de autógrafos, fotos e conversas como parte de sua missão. “Gosto da troca com eles”, afirma. A coisa só complica quando invadem seu espaço. Certa vez, enquanto estava hospedada em um hotel-fazenda de férias, um dos camareiros a acordou de um preguiçoso sono da tarde em seu quarto, enquanto os filhos e o marido estavam na piscina. Ele queria tirar uma foto. “Achei um pouco demais”, diz ela, rindo. No fim a foto foi tirada e o rapaz ainda reclamou da imagem. Faz parte.
Íntegra da entrevista com o Padre Fábio de Melo‏
ISTOÉ – Como a música passou a fazer parte da vida do senhor? Em quais ocasiões, seja na infância, adolescência, ou mesmo agora, surpreende-se cantarolando?
Padre Fábio de Melo – Já nasci com trilha sonora. Enquanto eu vinha ao mundo, o médico cantava “Jesus Cristo”, canção de Roberto e Erasmo. Minha mãe conta essa história para justificar o meu gosto pela música, mas também para ressaltar a minha opção pelas questões religiosas. Eu sempre tenho uma música na cabeça, ainda que não a cante. É um movimento natural que me leva ao centro da vida. A música é o meio de transporte por onde eu chego aos sentimentos do mundo.
ISTOÉ – Qual é o ritual do senhor antes de alguma apresentação?
Fábio de Melo – Não considero um ritual. Apenas gosto de ficar um tempo, ainda que breve, em silêncio antes de começar. Geralmente faço um aquecimento vocal antes do show, abençoo o palco e só.
ISTOÉ – A equipe de músicos viaja com o senhor no mesmo ônibus ou avião, para apresentações que necessitam de viagens?
Fábio de Melo – A equipe é grande. Saímos de diversos lugares do Brasil. Nem sempre vamos nos mesmos vôos, mas vez em quando a gente embarca no mesmo ônibus. São as melhores viagens. É o momento da convivência.
ISTOÉ – Aos músicos é indicado algum tipo de conduta, durante as viagens, ou nos dias que antecedem uma apresentação? Quantas pessoas fazem parte do staff musical do senhor?
Fábio de Melo – Uma conduta? Que sejam bons pais, bons maridos, bons amigos. A retidão de caráter é o resultado mais aprimorado que podemos esperar da religião. Eu tenho a graça de estar rodeado de gente assim. A unidade que experimentamos no palco é um desdobramento natural da vida que vivemos fora dele. Viajamos em 16 pessoas.
ISTOÉ – Como o senhor compõe? Com violão, sentado em um sofá de casa, na sala...? Há uma frequência?
Fábio de Melo – Eu componho toda vez que a criatividade se hospeda em mim. Nem sempre ela vem. Mas também não corro atrás. Aprendi que inspiração é bicho sem doma, não se deixa aprisionar. Mas quando ela me visita, não me faço de rogado. Paro de fazer o que estou fazendo e cuido do que ela me trouxe. Os lugares são inusitados. Ela não tem lugar para acontecer. Componho e escrevo muito durante os deslocamentos.
ISTOÉ – O sr. ensaia com a banda com que freqüência? Faz exercício para as pregas vocais?
Fábio de Melo – Só ensaio quando temos um projeto novo, como quando fizemos o show com o Milton Nascimento, ou quando temos uma música nova no repertório. O dia a dia da estrada nós já conhecemos bem. Eu não faço exercício para a voz. Só procuro usá-la corretamente.
ISTOÉ – O senhor e/ou a gravadora possuem metas, como lançar um CD por ano ou DVD por ano?
Fábio de Melo – Geralmente é um produto por ano.
ISTOÉ – Quantas missas o senhor celebra por semana e, geralmente, onde elas ocorrem?
Fábio de Melo – Procuro celebrar todo dia, mas nem sempre consigo. Como tenho muitas viagens, celebro sempre onde estou. Tenho uma capela na minha casa. Isso facilita muito.
ISTOÉ – O dia do senhor começa e termina que horas? O senhor tem sono tranquilo?
Fábio de Melo – Acordo cedo, mesmo que tenha ido dormir muito tarde. Meu sono é tranquilo. Se posso, durmo por volta de 23hs. Sonho mais acordado que dormindo.
ISTOÉ – Detalhe, por favor, o dia a dia do senhor em uma semana.
Fábio de Melo – Por conta das muitas viagens, quase não tenho rotina, mas gosto de levar minha rotina para onde estou. Quando estou em casa, acordo por volta de 7hs, faço minha oração e vou ver as notícias. Depois tomo café, respondo emails e vou trabalhar. Na parte da manhã eu me dedico aos estudos. Fiz faculdades de Filosofia e Teologia. Gosto me atualizar. Alterno os temas. Almoço por volta de 13hs e depois vou fazer o que faz todo cidadão. Pagar contas, mercado, médico, dentista, cuidar dos cachorros, tudo depende da necessidade do dia. À tarde faço alguma atividade física (aeróbico ou musculação). Tomo banho e volto a estudar. Depois janto, celebro missa, vejo mais notícias, leio e vou dormir. A leitura é a última coisa que sempre faço.
ISTOÉ – O senhor segue alguma dieta? Como são balanceadas as refeições do senhor? Faz exercícios com que frequência?
Fábio de Melo – Sou bastante disciplinado com a alimentação e a atividade física. Tenho consciência de que o cuidado com o corpo é também regra religiosa, pois através dele eu me disciplino para a conquista de virtudes espirituais. Cuidar da saúde é uma responsabilidade que não negligencio. Sempre arrumo um jeito de fazer uma atividade física, ainda que seja só uma caminhada.
ISTOÉ – Quando começa o processo para escrever um livro, o que muda em sua rotina? Em quais momentos o senhor rende mais para escrever? Escreve todos os dias? Por quantas horas? O senhor conta com o auxílio de alguém para a confecção de seus livros, alguém com quem troque idéias?
Fábio de Melo – Quando estou escrevendo fico bastante absorvido pelo texto. Escrevo e reescrevo inúmeras vezes. Não gosto de produzir com prazo estabelecido. A literatura tem ritmo próprio. Obedece ao movimento das palavras. Meu fazer literário é muito solitário, mas sempre nasce da vida que vivi ou que vi ser vivida ao meu lado. Minhas melhores ideias nascem da observação que faço do mundo. Só partilho o que realmente estou seguro de que vale a pena ser levado adiante. É aí que procuro os amigos para mostrar, trocar ideias.
ISTOÉ – Em quais momentos o senhor costuma ler a Bíblia? O senhor a lê todos os dias, impreterivelmente?
Fábio de Melo – Há duas formas de ler a Bíblia. Como estudo, respeitando métodos hermenêuticos, e como fonte de espiritualidade. A leitura estudiosa eu não faço todo dia. Já a leitura espiritual, esta faço diariamente. A vida oracional de um padre é toda ela baseada em textos bíblicos. A vida litúrgica nos favorece este contato com a Sagrada Escritura. É a oportunidade que tenho de estar em comunhão com toda a Igreja presente no mundo inteiro. O evangelho que proclamo, na missa que celebro em minha casa, é o mesmo que está sendo proclamado no Japão.
ISTOÉ – Lê a Bíblia pelo celular? O que pensa desse recurso?
Fábio de Melo – Já me utilizei para localizar uma passagem. É muito eficaz. Mas no dia a dia eu prefiro o livro mesmo.
ISTOÉ – Qual o ritual que o faz relaxar quando chega em casa depois de um dia de compromissos?
Fábio de Melo – Eu não bebo. Gosto de roça, bichos. É o que encontro quando chego em casa. Tenho pouquíssimos ruídos urbanos por perto. É assim que descanso. Cuidando e sendo cuidado a partir de uma simplicidade que me reporta aos tempos da minha infância. Estou cada vez menos urbano.
ISTOÉ – O senhor dirige, costuma ir ao banco, padaria, pegar fila em supermercado para pagar compras?
Fábio de Melo – Dirijo, vou ao mercado fazer compras. Gosto desta rotina. O que acontece sempre é que entre um afazer e outro sou abordado por alguém que se identifica com o trabalho que realizo. É o carinho das pessoas. Faço questão de cuidar bem de cada um que se aproxima.
ISTOÉ – Costuma visitar seus parentes ou reuni-los em sua casa?
Fábio de Melo – Minha família está esparramada pelo Brasil. Somos muitos. Eu os encontro mais durante os eventos. Meu contato maior é com minha mãe. Vez em quando ela passa um tempo na minha casa.
ISTOÉ – O senhor gosta de sair para jantar? Costuma fazer programas com amigos e amigas, como sair para ver filmes, exposições, correr em parques?
Fábio de Melo – Quase não saio. Sou caseiro por natureza. Gosto muito de teatro e música. Quando posso, vou ver alguma coisa. Nos meus dias de folga, gosto de andar a cavalo, cuidar pessoalmente dos meus cachorros, ajudar na limpeza da casa, do jardim. Para quem viaja muito, ficar em casa é sempre um luxo.
ISTOÉ – Até onde o senhor enxerga que vai a sua vaidade? Como o senhor procura cuidar da sua aparência? Usa cremes, protetor solar, tem predileção por um figurino ou sapato específico?
Fábio de Melo – Minha mãe fala que desde pequeno eu já escolhia o que iria vestir. Eu me cuido, sim. Vou regularmente ao dermatologista, pois já tive uma paralisia facial e câncer de pele, uso protetor solar e procuro controlar o peso. Meu figurino é sempre o mesmo. Estar bem vestido faz parte de meu trabalho. Sou um comunicador. Acho uma hipocrisia achar que o padre precisa andar mal arrumado, desleixado. Só que isso não é tudo. O que verdadeiramente conta é a elegância com que devo tratar as pessoas. Zelo muito para que todos, independente da vida que levam, se sintam respeitados por mim. Eu não sou melhor que ninguém. Apenas tenho uma missão que me diferencia.
ISTOÉ – Padre, poderia relatar um episódio que viveu recentemente ao lado de um fiel que o emocionou?
Fábio de Melo – Certa vez, esperando as malas na esteira do aeroporto de Guarulhos, encontrei uma senhora. Ela se aproximou e me disse, mais ou menos assim: “Padre Fábio, há dois anos atrás, eu havia programado o meu suicídio. Estava tudo pronto. Programei os mínimos detalhes. Na manhã escolhida, peguei o meu carro e me dirigia ao sítio onde eu daria fim à minha vida. Durante o trajeto, liguei o rádio e comecei a procurar alguma coisa pra ouvir. De repente, caiu numa estação onde alguém falava sobre a urgência que todo mundo tem de livrar-se dos fardos do passado. Era o senhor falando. Comecei a ouvir aquela pregação e senti que Deus falava comigo. Fui sendo envolvida a ponto de precisar parar o carro. Chorei muito. Senti que aquelas lágrimas me purificaram de tudo o que me oprimia. Decidi jogar fora os pesos do passado e resolvi me dar uma chance. Deu certo. Obrigado por ter me devolvido a vida.”
ISTOÉ – O senhor é uma pessoa que chora com frequência? O que o faz chorar? Lembra-se da última vez que chorou?
Fábio de Melo – Eu choro sempre. Não consigo me distinguir das dores do mundo. Minha alma não tem cercas.
ISTOÉ – O senhor possui alguma mania ou coleciona algum objeto?
Fábio de Melo – Manias? Acho que não tenho. Coleciono camisas de futebol, tenho cerca de trinta. Torço para o Cruzeiro.
ISTOÉ – Como o senhor se vê daqui a 5 anos?
Fábio de Melo – Feliz. Por estar mais próximo da aposentadoria. Eu não vejo a hora de adquirir os direitos dos idosos (risos).
Íntegra da entrevista com o Padre Marcelo‏ Rossi
ISTOÉ - Com gravação de DVD, sessões de autógrafo e viagens, como está a sua vida?
Padre Marcelo Rossi - Uma loucura, uma correria, mas uma benção.
ISTOÉ - O senhor tem hábito que repete todos os dias?
Padre Marcelo - Orar, todos os dias.

ISTOÉ - Que horas o senhor acorda?
Padre Marcelo - É relativo, porque estou viajando toda semana por conta dos autógrafos. Tem sido complicada a rotina. Tenho viajado toda segunda e voltado na quarta. Mas normalmente acordo 3h ou 4h da manhã.
ISTOÉ - A primeira oração ainda é na cama?Padre Marcelo - Não, a oração é na capela. Na cama eu acordo e agradeço a Deus.
ISTOÉ - O que come de café da manhã?Padre Marcelo - Não gosto de tomar nada de café da manha, apesar de saber que e errado. Geralmente almoço mais cedo, antes do meio dia.

ISTOÉ - Qual é a primeira atividade do dia?Padre Marcelo - Oração.
ISTOÉ - O senhor ainda tem os cachorros?Padre Marcelo - Sim, ainda tenho. Cuido todos os dias. Quando não posso, tem uma pessoa que cuida quando estou viajando. Na Cúria são dois cachorros. Um fila gigante e um dog alemão.
ISTOÉ - Que horas costuma almoçar?Padre Marcelo - Antes do meio dia.
ISTOÉ - O que gosta de comer?
Padre Marcelo - Descobri que tenho intolerância a glúten, me faz mal. Gosto de variar os pratos, não tem um em especial.
ISTOÉ - Como gosta de passar o tempo livre?
Padre Marcelo - Descansando.
ISTOÉ - Ainda tem uma hora para se exercitar?Padre Marcelo - Agora com essa correria tem sido mais complicado, mas procuro quatro vezes por semana fazer esteira e fisioterapia. Estou ainda com a perna em recuperação.
ISTOÉ - O senhor ensaia todos os dias?Padre Marcelo - Não, nunca ensaio nem faço exercícios, não dá tempo. Gostaria de fazer um curso de inglês mas não tenho tempo.
ISTOÉ - Quando precisa se deslocar, o senhor ainda dirige?Padre Marcelo - Tenho um Fiat Doblô. Parei de dirigir aos 40 anos. Prefiro não dirigir, apesar de adorar. É mais pratico, tenho um motorista, não preciso estacionar o carro.
ISTOÉ - O que te dá mais prazer atualmente? Cantar? Escrever?Padre Marcelo - O que me da mais prazer e evangelizar, seja qual for o meio: internet, celebrando a Santa Missa.
ISTOÉ - O senhor ainda administra o sacramento da confissão? Dá tempo?Padre Marcelo - Para a minha equipe sim. Lembrando que quando falo de minha equipe são mil pessoas.
ISTOÉ - Quando o senhor vai fazer um show, costuma se reunir com a banda antesPadre Marcelo - Não faço shows, eu classifico como eventos e dentro do Santuário, são missas celebradas, são missas com participação do povo. Sou reitor do Santuário. Não faço shows. Tenho uma base, que é o Santuário. Sempre reúno e rezo com eles. O restante vai fluindo. Cada missa é uma missa. Nada é muito combinado. A banda já me conhece pelo olhar. Dou o tom e eles vão junto.
ISTOÉ - O senhor está sempre de tênis. Por que?Padre Marcelo - Estou usando tênis por conta do impacto, ordens médicas por conta do joelho. E não sapato, que não é apropriado agora. Não escolho, tenho três ou quatro e vamos fazendo revezamento.
ISTOÉ - Além de Deus e Jesus, tem alguém que está sempre com o senhor?Padre Marcelo - Tenho, o Chicão, meu motorista que sempre está comigo. Me ajuda a conectar o programa da Rádio Globo quando estou fora de casa, com o aparelho matrix. E em tudo mais que for necessário.
ISTOÉ - O senhor usa celular? Usa o computador?Padre Marcelo - Tenho celular, Nextel e um iPhone, que não uso tanto. Mas tenho um iPad e um notebook, sou conectado na medida que dá tempo. Hoje a internet é um meio muito importante para a evangelização.
ISTOÉ - Como a música passou a fazer parte da sua vida?Padre Marcelo - Desde criança. Eu me pego cantarolando desde o Seminario, onde formei uma banda e era vocalista.
ISTOÉ - Qual é o seu ritual antes das apresentações?Padre Marcelo - Apresentação não, missa. Tomo cuidado com a roupa litúrgica que vou colocar, que esteja de acordo com o momento.
ISTOÉ - Aos músicos é indicado algum tipo de conduta durante as viagens ou nos dias de apresentação?Padre Marcelo - Eles raramente, muito raramente viajam. Nas tardes de autógrafo sou só eu e uma equipe pequena do Santuário que ajuda na organização.
ISTOÉ - O senhor tem sono tranquilo, sonha bastante?Padre Marcelo - Tenho sono tranquilo. Só tenho pesadelo quando como pizza de noite.
ISTOÉ - Quando começa a escrever um livro, como muda sua rotina?Padre Marcelo - Na verdade só consigo escrever parando tudo. Agapinho fiz nas minhas férias e o Ágape foi quando quebrei o pé. Desconecto de tudo, menos do programa da Rádio Globo. Tenho que estar focado para escrever.
ISTOÉ - Qual o ritual que o faz relaxar quando chega em casa depois de um dia de compromissos?Padre Marcelo - Assitir um filme. Já assisti todos da locadora ao lado.
ISTOÉ - Poderia citar um episódio marcante de um encontro inesperado com um fiel?Padre Marcelo - Uma vez marcante foi uma senhora que me viu quando eu ainda dirigia. Estava na rua e ela começou a me fechar e eu subi literalmente em cima da calçada. Ela parou, se ajoelhou e pediu uma benção, foi aí que comecei a me preocupar e achei que era melhor parar de dirigir.
ISTOÉ - Com que frequência visita seus pais e vê suas irmãs?Padre Marcelo - No mínimo três vezes por semana, eles vem até mim no Santuário.
ISTOÉ - O senhor gosta de sair para jantar? Costuma fazer programas com amigos e amigas, como sair para ver filmes, exposições, correr em parques?
Padre Marcelo - Não da para sair, ir em supermercado, restaurante.
ISTOÉ - O senhor chora com frequência?
Padre Marcelo - Eu sou muito emotivo. Qualquer coisa eu me emociono. Muitas vezes no programa da rádio ouvindo um testemunho. Não chorar, mas emoção, das lágrimas escorrerem dos olhos.
ISTOÉ - Como é que o senhor se enxerga daqui a alguns anos?
Padre Marcelo - Com mais experiência. Mas trocaria por 3 corpos de 18 anos


Abuso sexual: O longo caminho da superação

Aumentam as denúncias de violência contra crianças e adolescentes, mas ainda é preciso avançar no atendimento às vítimas e na punição dos culpados

Natália Martino
chamada.jpg
"Eu sabia que era errado porque ele me pedia que não contasse a
ninguém e porque nenhum outro adulto fazia aquilo comigo"

L., que foi abusada pelo avô
Ao o romper o silêncio e contar, na tevê, ter sido vítima de abuso sexual na infância, a apresentadora Maria da Graça Meneghel, a Xuxa, jogou luz sobre um tema que somente agora a sociedade começa a encarar de frente. O resultado mais imediato do depoimento foi o aumento de ligações para o Disque Direitos Humanos, o Disque 100. Nos dois dias seguintes ao seu desabafo, no domingo 20, o principal canal de denúncias de violência contra crianças e adolescentes recebeu 285 mil ligações, 30% a mais do que nos mesmos dias da semana anterior. Um pico como esse é raro, mas o histórico do Disque 100 mostra um crescimento do número de ligações ano a ano (leia quadro), reflexo do maior conhecimento das pessoas sobre o tema. O primeiro passo para resolver o problema é saber suas proporções, mas o caminho até a superação do trauma por parte da vítima e a punição de seu algoz é longo. E nisso o Brasil está apenas engatinhando.

As denúncias chegam, em geral, por conhecidos das vítimas, raramente pelas pessoas abusadas. “Por um misto de medo e culpa, muitas delas passam décadas sem compartilhar a dor com ninguém”, explica a psicóloga Elizabeth Vieira Gomes, do Comitê Nacional de Enfrentamento de Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. Xuxa levou mais de 30 anos para assumir publicamente os abusos. O silêncio de L. durou 12 anos. “Eu tinha medo de ninguém acreditar em mim, ele era uma pessoa em quem todos confiavam”, conta. Ela não tinha mais de 4 anos quando o avô lhe disse “olha o que eu tenho aqui, é diferente do que você tem”, e lhe mostrou seu órgão sexual. A carioca de 31 anos não se lembra de detalhes desse dia, mas tem recordações claras das carícias sexuais que ele lhe fez aos dez anos. “Eu sabia que era errado porque ele me pedia que não contasse a ninguém e porque nenhum outro adulto fazia aquilo comigo”, diz. Só aos 16 anos ela confessou o ocorrido à mãe. “Passei esse tempo nutrindo ódio pelo meu avô sem nunca revelar a razão”, diz ela.

As reações de descrença em Xuxa manifestadas nas redes sociais também acontecem com anônimos. Muitas vezes, por parte de quem deveria ajudar a vítima. “É comum os médicos e os policiais dizerem que tudo não passou de ‘sem-vergonhice’ da pessoa que sofreu o abuso”, afirma Waldemar Oliveira, do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente Yves de Roussan da Bahia (Cedeca). Em alguns hospitais do País, porém, a situação é diferente. No Hospital das Clínicas de São Paulo, por exemplo, funciona há dez anos o Núcleo de Assistência à Vítima de Violência Sexual (Navis). Trata-se de um grupo formado por enfermeiros, assistentes sociais e médicos de várias especialidades que se empenham em prestar atendimento rápido e eficiente a quem precisa. “Os casos de violência sexual exigem muita sensibilidade”, diz a médica Ivete Boulos, coordenadora do Núcleo. As vítimas, e, às vezes, alguns familiares, também recebem acompanhamento psicológico por, no mínimo, seis meses.

“O médico precisa estar preparado para fazer o primeiro acolhimento, pois os remédios que podem prevenir Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs) só são eficientes nas 72 horas posteriores à agressão”, diz Ivete. Segundo ela, há pessoas que chegam anos depois de terem sofrido a violência e são diagnosticadas com doenças como sífilis e vários problemas psicológicos. Em outros casos, pais levam os filhos para tratar problemas de saúde e os médicos detectam a existência de DSTs. Serviços desse tipo também existem em cidades como Ribeirão Preto, Campinas, Belo Horizonte, Curitiba e Goiânia, mas ainda não estão presentes na maior parte do País.

Nas esferas legislativa e jurídica também são necessárias adaptações. O avanço mais recente foi a sanção da lei que define que o tempo de prescrição do crime de abuso sexual conta a partir dos 18 anos da vítima. No campo jurídico, as mudanças começaram na década de 1990 com a criação de varas especializadas em infância e juventude. “Nas varas comuns, o objetivo é prender o suspeito, nas especializadas a prioridade é acolher as vítimas”, explica Lélio Ferraz de Siqueira Neto, promotor de Justiça da Infância e Juventude do Ministério Público de São Paulo. Para isso, os membros recebem treinamentos especiais e até alguns dos processos são revistos. Em São Paulo, a criança presta depoimento uma única vez e não precisa repetir a história para o delegado, depois para o promotor e assim por diante.

Essas varas especializadas agilizam o julgamento dos casos. De acordo com levantamento realizado pelo Cedeca da Bahia, antes da criação da primeira vara especial do Estado, em 1997, a maioria dos processos de abusos sexuais demorava tanto tempo para ser julgada que prescrevia. Com as varas especializadas, o problema praticamente acabou e o tempo de tramitação, que antes variava entre seis e dez anos, passou a ser, no máximo, de dois anos. No entanto, ainda existem pouquíssimas dessas varas no País. A média é de um juiz especializado para atender quase 400 mil pessoas. Essa deficiência, aliada à dificuldade em se conseguir provas de uma agressão que acontece, na maioria das vezes, dentro da casa das vítimas, resulta em um enorme número de casos sem solução. É preciso mudar essa realidade.
img.jpg

O passado de Xuxa

Parentes foram surpreendidos pela revelação da apresentadora que cresceu em uma família desestruturada

Michel Alecrimm e Tamara Menezes
img.jpg
Xuxa disse que os abusos só cessaram aos 13 anos.
"Nunca pensamos que poderia ter
acontecido um negócio desses"
,
Chester Meneghel, primo
Ela era uma menina linda, loura, comunicativa e feliz até ter sua infância maculada: passou a ser molestada sexualmente por adultos, crime que perdurou até completar 13 anos. Maria da Graça Meneghel nasceu na pequena cidade gaúcha de Santa Rosa, onde viveu até os 7 anos, e depois mudou-se com a família para o subúrbio carioca de Bento Ribeiro. Amigos, ex-vizinhos, ex-colegas de escola de ambos os lugares a descrevem como uma garota normal de família classe média baixa, que subia em árvores, pulava corda, saltava sobre muros. Destacava-se pela desinibição. No colégio Itu, em Bento Ribeiro, era chamada de “rainha da fanfarra” porque desfilava com balizas em eventos escolares. Alta, vestia-se com paetês e bordados, além de botas. Aos 13 anos, foi eleita Rainha do Carnaval no balneário de Coroa Grande, em Itaguaí (RJ). Tanta desenvoltura e um porte físico muito desenvolvido para sua idade também atraiu homens adultos que não respeitaram sua inocência. 

“Ela desfilou em bugres com a faixa de Rainha”, lembra Marilda Carvalho, atual diretora do Itu. A professora aposentada Élida Fialho conta que Xuxa surrupiava goiabas no terreno de sua casa até que seu pai decidiu oferecer as frutas que ela gostava tanto. “Todos a conheciam como a menina que passeava com o cachorrinho”, afirma Élida. Já a família era vista como “mais fechada”, como disse uma moradora do bairro, que não quis se identificar. “Todos sabiam que o pai dela (o militar Luiz Floriano) havia se separado da mãe e pouco ia à casa”, afirmou. Hoje, o apartamento é mantido vazio pela apresentadora. Segundo o porteiro Reginaldo Herculano Gomes, uma diarista é paga para limpar o imóvel e há um ano foi feita uma reforma. 

“É uma família em que todos são ausentes uns dos outros”, disse uma conhecida que prefere o anonimato. A péssima relação com o pai resultou num afastamento de sete anos. Xuxa só voltou a falar com ele em 1997. Entre os irmãos, Solange, Bladimir, Mara Rúbia e Cirano, era próxima apenas dos dois primeiros. “Fomos surpreendidos com a revelação. Nunca pensamos que poderia ter acontecido um negócio desses. A família está meio assustada”, disse à ISTOÉ o primo Chester Meneghel. A mãe de Xuxa, Alda, sofre de mal de parkinson e está em tratamento na Argentina. Procurado por ISTOÉ, o pai não atendeu aos telefonemas e, segundo amigos e vizinhos, está viajando.